«O cartaz dos Gatos Fedorentos foi saudado encomiasticamente como uma nova forma de civismo, como representativo de uma acção política eficaz, com novidade e criatividade. As razões que são dadas têm a ver com o poder do humor, do riso "castigador dos costumes". Penso, no entanto, que essa não é a questão essencial... Duvido. Duvido da sua eficácia, duvido da sua vantagem, medindo-a em função dos objectivos explícitos dos seus autores e da mensagem pública que pretendiam transmitir. Duvido que, neste caso, haja riso suficiente para castigar os costumes. Bem pelo contrário, nem riso, nem castigo.
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Uma coisa é fazer uma capa do Inimigo Público, ou um cenário de um sketch televisivo, outra é um cartaz numa praça pública, ao lado de outro cartaz a que pretende servir de contraponto, instalados no terreno de uma questão política por excelência - a emigração - e que, por o ser, divide interesses, percepções e preconceitos. A transposição de uma linguagem como o humor de um meio controlado pelos seus próprios termos espectaculares - visto que a eficácia dos Gatos Fedorentos vem essencialmente do texto representado e não da escrita - para o espaço público de uma praça, onde já praticamente ninguém "faz" política, é uma mudança qualitativa. O humor na Praça do Marquês de Pombal não transporta consigo os mesmos códigos do "espectáculo" original e tem efeitos perversos, ruído, incontroláveis pelos seus autores. É que do outro lado está o cartaz do PNR.
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Mas o risco maior é o de as pessoas começarem a identificar uma orientação política explícita na actuação do grupo. Porque, depois, começam a perguntar-se por que razão é que eles acham o PNR, Portas e Lopes ridículos e Louçã não. Ora esta pergunta não tem humor nenhum, porque os maus "costumes" que o riso "castiga" estão bastante bem distribuídos em todos os lados da política.»
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