Thursday, November 29, 2007

Chantagem

Quando se candidatou, sabia o que o esperava. Esta atitude, agora, tresanda a chantagem. E a fraqueza. O fado da CML continua, só mudou o fadista.

Broken Mirrors

«N'ayez pas peur de faire de grands rêves»
Nicolas Sarkozy

Colonialismo (II)

A cimeira UE/África, a pretendida cereja no bolo que tem sido a presidência portuguesa, quase se tem limitado, até agora, ao fait divers em torno do vem/não vem de Robert Mugabe, que, de acordo com afirmação do próprio, vem. E, como ele vem, não vem Gordon Brown, e, por solidariedade com este, talvez mais uns quantos líderes europeus fiquem em casa e mandem os seus rapazes de mão. Ora, o que me parece triste, neste pandemónio de sensibilidades políticas, não é a presença de um e a ausência de outro, por muito que os analistas a soldo do regime nos queiram distrair com o foguetório do marketing político, para europeu ver. Mugabe fará a sua parte, o representante do Reino Unido a dele, mas nem será a este duelo que se limitará o sucesso, ou o insucesso do encontro, que, sim, ficará marcado pela capacidade que os dialogantes tiverem de ultrapassar os traumas da colonização, as questiúnculas políticas de circunstância, os conflituais interesses regionais, todos tão ao gosto dos africanos e tão apetecidos pelos europeus, que, digam o que digam, se encontram ainda reticentes a uma real parceria com o continente negro. Sendo indiscutível a utilidade e oportunidade deste diálogo UE/África, constata-se que, contrariamente ao que a propaganda do governo nos quer fazer crer, Sócrates e a sua equipa não eram os anfitriões mais indicados para este encontro, que, para cumprir os seus objectivos, requeria do organizador autoridade moral, credibilidade e peso político, bem servidos por um discurso corajoso para os ambos os lados do conflito Zimbabwe/UK. Ora, o que se vê é que, apesar da influência tutelar de Durão, apesar da confluência de interesses num lado e noutro da mesa, apesar do discurso de circunstância que vai de São Bento a Belém, a presidência portuguesa nesta cimeira está já irremediavelmente fragilizada pelo ridículo dos episódios de convida/desconvida, que Luís Amado aceitou protagonizar, quando ficou evidente que Brown não cederia a Sócrates e não se sentaria à mesma mesa que Mugabe. Sócrates, autoritário e vaidoso como é, mas também subserviente sempre que os seus interesses pessoais e futuro político falam mais alto, convenceu-se que, posto perante a inevitabilidade, Brown cederia. Enganou-se, porque nem Downing Street é São Bento, nem o reino de sua Majestade se verga, como a história está farta de nos demonstrar, e para comprová-lo nem é preciso recorrer a um manual em inglês técnico, porque as traduções em bom português abundam. Nestes meses de preparação, a dias do início da cimeira, de que nos foram dando, e continuam a dar conta os jornais e televisões? Palram sem cessar de Mugabe, que não se sabe se vem; de Khadafi, que ficará numa tenda e trará a guarda feminina; dos hotéis que estão cheios, com as delegações exóticas dos africanos, que acreditam desde o cozinheiro/provador ao cabeleireiro e manicura; do desconforto do governo português, que preferia que Mugabe não viesse; das ruas fechadas ao trânsito; dos carros blindados; de Mugabe, que sempre vem; de Brown, que não vem; de novo de Khadafi e da sua tenda, blablabla, rebobina e exibe de novo. Do que interessa discutir à mesa das conversações, do que se espera deste importante encontro, do futuro das relações bilaterais, de como gerir o que sobra a uns e falta a outros, do que é estratégico e do que não é, do que pode, e DEVE, a Europa fazer por uma África que ainda não encontrou o seu caminho, que a presença europeia poderá ter condicionado por anos, todas estas questões se esfumam atrás do nariz de palhaço de Luís Amado, a lamentar que Mugabe, afinal, tenha aceite o convite que lhe fez. À boa maneira portuguesa, a desculpabilização do desaire já começou, acusando-se Mugabe de ser o causador do ruído que abafa o real interesse deste encontro. Mas sobre este interesse nenhum membro do governo foi capaz de alinhavar duas frases coerentes. Se a crise Mugabe/Brown ofusca a Cimeira, não seria obrigação dos profissionais que pululam nas Necessidades e em São Bento prevenirem, antecipadamente, tal possibilidade? Será que ninguém, no governo, pensou um pouco que fosse nas razões que levaram a que esta cimeira estivesse adiada por tantos anos quantos Jacob serviu? Ou a vaidade cegou-os? Tal como a primeira, efectuada também sob a égide de uma anterior presidência nossa, esta Cimeira UE/África corre o risco de ser mais uma cimeira à portuguesa, isto é, com muita parra e pouca uva.

Wednesday, November 28, 2007

Colonialismo (I)

A leitura desta opinião de Licínio Lima remeteu-me para a memória dos últimos anos antes do 25 de Abril, mais correctamente, talvez, para o crescendo de vozes contra a guerra do ultramar, que se viveu no último ano antes da revolução de Abril. Vivi essa época com a intensidade de sentimentos que só se tem aos vinte anos, mas também com o distanciamento do real que alguns jovens, criados na pacatez de uma vida familiar de que está ausente a tragédia da guerra, conseguem ter. E, no entanto, posso dizer que sofri a guerra de muito perto, se bem que nenhum dos meus familiares fosse, à época, militar. E vivi essa guerra por dentro, porque estava no teatro da guerra, e porque grande parte dos meus amigos se fardou no intervalo dos bailaricos da nossa adolescência e dos cursos que nos deviam preparar a idade adulta. Alguns marcaram encontro com as balas dos que lutavam pelo que julgavam ser a sua liberdade, outros desfardaram-se sem traumas de maior, outros carregam até hoje os fantasmas dessa chamada às armas. Quem viveu esses tempos sabe que a guerra do ultramar se tinha tornado um pesadelo para as famílias dos mancebos, e para alguns destes também. Mais do que o amor à liberdade, mais do que as convicções democráticas, mais do que o respeito pelo direito dos povos colonizados à sua independência (tenham dito o que disseram depois dos cravos), a raiz da contestação destas famílias com filhos para dar à guerra era o medo, o medo avassalador da morte, ou de pior sorte, para os seus jovens. E mais ainda do que nestes, foi nas famílias que fermentou a revolta, que se instalou a resistência, que se clamou pela liberdade, a solidariedade e a democracia, mas tão só para abafar os sons do medo. A este não chamo eu cobardia, como fez o moribundo Franco, verbalizando o que outros povos de nós pensaram, e pensam, até hoje, porque chamar-lhe medo basta, para nos definir enquanto povo que é mais fado do que epopeia. Sempre percebi as famílias e o seu medo, sempre respeitei aqueles que estimam a sua vida acima de decisões que, a eles alheias, lhes querem encarreirar o destino para um fim trágico, que não escolheram. Percebi o indivíduo e as suas circunstâncias, porque a gesta heróica não é um peso que carregue qualquer um, apenas os visionários, ou aqueles para quem a vida só faz sentido na partilha e na pertença de um bem maior, porque de todos. Mas se alguns como eu compreenderam, e perdoaram a mentira que cobriu a soma dos medos individuais, outros houve que preferiram chamar-lhe liberdade, e confundi-la com um novo Portugal. Foi esse Portugal que não fez Abril por convicção democrática, embora esta possa ter estado presente no coração de alguns dos mais cerebrais militares do MFA. Foi esse Portugal que não fez Abril por querer devolver independência e dignidade aos povos que colonizou, pese embora o direito que a estes assistia, direito tão mal servido pelo discurso hipócrita de alguns corrompidos lateiros dos quartéis, que ficaram como heróis para triste memória colectiva. Foi esse Portugal que derrubou o regime envelhecido, que um também envelhecido Caetano carregava nos pouco convictos ombros, mas esse Portugal era apenas a soma dos muitos que tiveram medo, medo da guerra, medo da morte. Mais de trinta anos passados, podemos escrever isto, assim, aceitando e perdoando, porque ter medo é humano, todos o temos, e até Cristo, na cruz, na sua derradeira demonstração de humana divindade, escolheu o medo, perante a morte terrível, para invocar o Pai, e poder afastar de si tão cruel cálice.
Choca-nos a morte de um jovem português, hoje, numa guerra que não é nossa, mas que é de todos. A guerra dos seus avós também o era, embora, à época, todos preferissem esquecê-lo. E tanto era de todos, que o futuro que então se desenhou vive-se hoje na intolerância que cresceu no mundo, e que é a mãe de todas as guerras, todas nossas, estejamos ou não nelas. Pode lamentar-se Licínio Lima pela falta de evolução do mundo que conhecemos, mas, desde que o mundo é mundo, é mesmo assim, e, por muito que nos custe, vai continuar a sê-lo. Aos portugueses faltou compreendê-lo, então. Espero que as crianças que hoje assistem do pátio da escola ao enterro do jovem soldado tenham a oportunidade de aprender que, apesar da dor, apesar do medo, haverá sempre alguns que cairão, na luta de todos pela humanidade. Os seus avós preferiram não o perceber, com as consequências que sabemos. Detectam-se preocupantes sinais de que os seus pais estão a ser, eles também, conduzidos ao mesmo trilho. Insidiosamente, o medo instala-se, de novo. O fado vinga. A epopeia morreu há muito.

Tuesday, November 06, 2007

Broken Mirrors

«I trust that everything happens for a reason, even when we're not wise enough to see it
Oprah Winfrey

Oprah, o sonho desfeito?

Foi com o entusiasmo do sonho de um legado inteligente e generoso que a ultra famosa Oprah financiou, e mantém, uma selecta escola para meninas africanas, a Oprah Winfrey Leadership Academy for Girls, na África do Sul. Mulher de sucesso a nível mundial, Oprah percebeu que investir na educação de futuras líderes africanas pode ser um dos melhores investimentos a fazer pelo futuro de África. É, portanto, compreensível o choque e a revolta com que tomou conhecimento da violência e dos abusos sexuais praticados por uma professora responsável, contra alunas da academia. Oprah, ela própria abusada na infância, tem sido uma lutadora determinada contra os abusadores de crianças, pagando do seu bolso prémios pelo seu encarceramento, o que nos leva a acreditar no extremo sofrimento que estes infelizes acontecimentos lhe trouxeram. Apesar da desilusão que tudo isto não deixará de constituir, importa que não desista, nem do projecto, nem da elevada exigência com que o mesmo nasceu.
Don't give up Oprah. You are working for a better world.

Duelo à sombra

Ao que parece, Sócrates não deixou os seus créditos por mãos alheias e (sabe-se lá se de mão na anca), achou necessário vir lembrar os erros do oponente, no seu triste passado de governante. Do inquilino de São Bento não se esperava mais, lamenta-se é que não perceba que a sua sanha engrandece um adversário que não merece tanto trabalho. Diz o povo, que é sábio, que o desprezo é o pior castigo. O senhor engenheiro, que é um deslumbrado, não acredita. Depois, queixe-se!

Violência na escola

A ministra fala, fala, fala, mas nada do que diz vale nada, e nada do que faz serve de alguma coisa. Infelizmente, casos como o deste aluno, que aos 10 anos agride uma professora a pontapé e à dentada, são mais frequentes do que quer acreditar a maioria das boas almas, que chama malandros aos professores. A ministra sabe-o, mas convém-lhe ignorar o óbvio, porque agir em conformidade não rende votos e sai caro. Por seu lado, o governo fala em investigação prioritária para crimes como este, mas é só discurso para render nos telejornais, porque consequência é coisa que não têm actos como este. Com grande prejuízo dos professores, dos alunos e, sobretudo, dos próprios agressores, a quem a impunidade serve de escola de deliquência.

Jardins

The Butchart Gardens

Monday, November 05, 2007

Broken Mirrors

«Todos os acasos da nossa vida são materiais de que podemos fazer o que quisermos.»
Friedrich Novalis

Antologia

Renoir



Naquele “pic-nic” de burguesas,
Houve uma coisa simplesmente bela,
E que, sem ter história nem grandezas,
Em todo o caso dava uma aguarela.

Foi quando tu, descendo do burrico,
Foste colher, sem imposturas tolas,
A um granzoal azul de grão de bico
Um ramalhete rubro de papoulas.

Pouco depois, em cima duns penhascos,
Nós acampámos, indo o sol se via;
E houve talhadas de melão, damascos
E pão de ló molhado em malvasia.

Mas, todo púrpuro, a sair da renda
Dos teus dois seios como duas rolas,
Era o supremo encanto da merenda
O ramalhete rubro das papoulas!



Cesário Verde

Falta injustificada

A cronologia dos actos do governo quanto ao regime de faltas estabelecido no novo estatuto do aluno é reveladora da sua falta de convicção sobre a matéria, e de como a opção inicial, visivelmente defendida pela ministra, se destinava, simplesmente, a conseguir as estatísticas de um sucesso, que a realidade teima em desmentir.
Digam o que disserem a ministra, os deputados, secretários de estado e afins, houve recuo, porque o governo, cativo da sua incapacidade de inovar e enredado nas teias da sua própria propaganda, não foi capaz de dar o salto para uma mudança de paradigma, que poderia constituir-se como um projecto embrionário da nova Escola que, inevitavelmente, teremos que saber inventar, construir e manter.
Passou-se ao lado, desperdiçando uma rara oportunidade de usar um dos piores defeitos da ministra, que, para o caso, se revelaria uma qualidade inestimável - a sua obstinada surdez a tudo aquilo que não está no seu horizonte de decisão. Talvez porque, com coragem e visão, esta poderia ter sido uma boa decisão, fosse o governo capaz de a reconhecer e tomar.
Sócrates, ao que parece influenciado pela figura presidencial, terá sido o Sansão que cortou os cabelos à sua Dalila. Inverteram-se os papéis, mas, segurando a sua ministra, enfraqueceram ambos.

Jetlag

Para um país a braços com uma situação económica desconfortável, a predisposição deste governo para a passeata à conta do contribuinte é notável, pela falta de vergonha que representa.
Num arrobo de caridade cristã, e procurando deixar de lado a eventual demagogia a que uma leitura simplista nos pode conduzir, logo pensei que o aumento se justificaria porque o MNE teria um pesado follow up da presidência portuguesa, ou porque decidiu resolver as situações que tanto nos têm envergonhado, com a falta de recursos das nossas representações diplomáticas. Pasmei quando percebi que não é nada disso, que o big spender é o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior! Bem gostaria eu de perceber as boas razões para tal, mas, pelo que conheço da casa (e não é muito, registe-se) só consigo perceber tão chorudo fundo turístico pelas péssimas razões. Num ministério em que alguns organismos nem têm dinheiro para coisas tão básicas como comprar papel, toner, canetas, envelopes, mas em que os seus dirigentes passam a quase totalidade do seu tempo em reuniões, congressos e eventos vários no estrangeiro, não é difícil perceber a prioridade (e a irresponsabilidade) do governante. Se ainda se vissem resultados, até poderíamos aceitar as idiossincrasias ministeriais, mas é fácil comprovar que neste ministério nem o pai morre nem a gente almoça!
Estando Portugal tão bem colocado no ranking do e-government, não lembrou a ninguém substituir umas viagens por comunicações à distância? Sempre saía mais barato, e caía bem ao sacrificado contribuinte! Não é só andar a distribuir computadores pelas escolas, senhor Engenheiro Pinto de Sousa, é pôr em prática o que apregoa!

A guerra das estrelas

Santana Lopes, intuitivo como é, concluiu que já não lhe chega comparar-se a Sá Carneiro, porque o ilustre defunto jaz e arrefece há muitos anos, e nada diz ao Portugal votante de hoje. Calculista, PSL resolveu agarrar-se ao estribo de Belém (como se este estivesse vago, ainda mais para ele!) e compara um novo ciclo político, que ele pretende ver abrir-se com o seu «combate» com Sócrates na AR, à chegada ao poder de Cavaco, nos idos de oitenta.
Já sabemos que timidez e modéstia são qualidades que PSL não cultiva, mas até para ele esta associação se torna ridícula, apesar da erosão que o tempo provocou na qualidade da nossa classe política, triste fado ao qual já todos nos conformámos. Parafraseando PSL, está escrito nas estrelas que os portugueses, que até podem não saber para onde vão, sabem, de certeza, que não vão com ele a parte nenhuma.