Monday, May 29, 2006

Gene canhoto

Preparava-me para reagir às virgens ofendidas com a exploração do trabalho infantil, muito escandalizadas com as mãozinhas que cosem os sapatos da Zara, mas que tão facilmente se esquecem das crianças que trabalham em moda, publicidade, cinema e televisão (quando não se inibem de realçar o talento e a performance dessas crianças, sem que, concomitantemente, alertem para que essas situações também configuram exploração do trabalho infantil) e eis que encontro a Joana Amaral Dias a escrever sobre a questão.
Só posso concordar. Sobre a ponta deste iceberg, ela diz (bem) o que há a dizer, e deixa subtilmente no ar o muito que não se diz, mas que tanto nos deve preocupar!

E já que falamos em delírios...

...não podemos deixar de dar razão a João César das Neves, que, no mesmo jornal, tenta baptizar a crise portuguesa, concluindo que há:«um nome que ela não pode ter: o de "crise de austeridade". É que, embora se fale muito, não se vê austeridade em lado nenhum. Se a História futura se limitar a ler os jornais e discursos actuais, é possível que acredite que a origem das dificuldades está na redução da despesa pública. Mas se olhar para os números do Orçamento notará que "contenção da despesa" é coisa que não se vê: os gastos públicos só sobem
Quando se gasta hoje o dobro do que quando entrámos para a CEE, a crise só pode mesmo chamar-se «a "crise delirante". Quando os ministros se atropelam a apresentar excelentes ideias para gastar mais dinheiro a resolvê-la; quando um distinto sindicalista diz impunemente que não há funcionários públicos a mais, é porque deve estar tudo doido!»
Com tanto delírio à solta por aí, percebe-se que o governo queira fechar hospitais psiquiátricos. Há que acautelar o futuro e uma ilhazita das Bahamas sempre é mais apetecível para uma aposentadoria dourada, bem longe do caos que deixaram atrás de si.

Segurança Social: o delírio reformista

O título pertence a um artigo de Manuela Arcanjo, hoje no DN, em que nos alerta para o perigo de «um Governo que afinal só quer reduzir despesa e aumentar receita perante cidadãos passivos e mal informados»!
Depois de escalpelizar dignósticos, linhas estratégicas e medidas preconizadas pelo governo socialista para a segurança social, Manuela Arcanjo conclui assim: «Cuidado: não faltará muito para a eliminação "teórica" de todas as medidas introduzidas após 1974 por não ter sido acautelada a sua sustentabilidade. Afinal, o Governo não é reformista, mas apenas um conjunto de mentes delirantes. Não se poderá criar um "factor de penalização"?»

Caixa de entrada

Se não te concedes o direito de esperar, não desesperes.


Andre Derain

Saturday, May 27, 2006

Pais a avaliarem os professores dos filhos...

Se já não soubessemos que esta ministra despreza, profundamente, a classe docente, bastava esta proposta da tutela para o ficarmos a saber. De uma penada, o ME domestica os pais, controla ferreamente a "relação pedagógica" (?), põe algemas na organização interna da escola, acaba com o insucesso escolar e mostra resultados em Bruxelas. Como esperteza saloia, é soberba, mesmo que, para isso, tenha que aniquilar a dignidade profissional daqueles que têm a seu cargo a responsabilidade da formação académica dos portugueses.
Presumo que o governo, a seguir, proponha o mesmo princípio para todos os serviços públicos. Já me vejo a avaliar médicos e enfermeiros, o pessoal dos transportes públicos, das repartições de finanças e tribunais, dos serviços municipalizados, dos organismos do estado... Com tanta avaliação para fazer, será que me sobrará tempo para dar aos papás a oportunidade de me avaliarem?
HAJA VERGONHA!!!!!
Nota: defendo, intransigentemente, a avaliação dos docentes, mas não palhaçadas como esta.

E eu que julgava a Shakira um animal de palco!

O directo na televisão foi-lhe fatal. Robótica e estandardizada, despida dos acessórios da engenharia de voz, pouco sobrou para além da dança do ventre mecanizada. O público, caninamente, rendeu-se-lhe, obediente às regras do jogo, que mandam fruir a festa.

Friday, May 26, 2006

"Rock-a-by baby in the tree top/When the wind blows the cradle will rock."

Continuando ainda com a honrosa visita do senhor Welch, presume-se que tenham os seus anfitriões querido mostrar ao ilustre visitante os locais mais nobres do perímetro turístico desta bela cidade de Lisboa, pelo que toda a emblemática zona ribeirinha da capital não deverá ter escapado a esse circuito. Se assim foi, Jack Welch sairá de Portugal ainda muito mais embaraçado do que entrou, já que não é hábito nas grandes capitais encontrar esgotos a correrem para o rio sem qualquer tipo de tratamento.
À boa maneira portuguesa, discutem-se culpas e não culpas, que, entretanto, coitadas, morrem solteiras. Como sempre.

Portugal precisa de um grande abalo, diz ele*. E como precisa!

Anda para aí um senhor *Welch, considerado "apenas" o melhor gestor do séc. XX, a dizer que é humilhante para Portugal a imagem que temos no exterior, como um país em permanente degradação e declínio, logo quando nós, à conta de uma comunicação social histérica e saltitante, nos sentimos impantes de orgulho e satisfação, com o estrondoso sucesso que é já o Rock in Rio, que deverá receber «cerca de 386 mil pessoas em cinco dias de concertos, numa média de 77 mil espectadores por diaE não fosse dar-se o caso de haver cépticos em relação à magna importância do evento, informam-nos, diligentes, que só «Até ao início da semana passada tinham sido vendidos cerca de 180 mil bilhetes», isto ao "precito" que sabemos!
Ou o senhor Welch não percebe nada cá da chafarica tuga, ou então andamos todos numa «ganda nice».

Sailing



Siegfried Zademack



After having loved we lie close together
and at the same time with distance between us
like two sailing ships that enjoy so intensely
their own lines in the dark water they divide
that their hullsare almost splitting from sheer delight
while racing, out in the blue
under sails which the night wind fills
with flower-scented air and moonlight
- without one of them ever trying
to outsail the other
and without the distance between them
lessening or growing at all.

But there are other nights, where we drift
like two brightly illuminated luxury liners
lying side by side
with the engines shut off, under a strange constellation
and without a single passenger on board:
On each deck a violin orchestra is playing
in honor of the luminous waves.
And the sea is full of old tired ships
which we have sunk in our attempt to reach each other.

Henrik Nordbrandt

Thursday, May 25, 2006

Possível transmissão do vírus da gripe das aves entre humanos

A OMS admite que a morte de seis pessoas de uma mesma família, na Indonésia, possa configurar uma primeira evidência da transmissão do vírus H5N1 entre humanos.
Por cá, e como só sinto um silêncio sepulcral sobre o assunto, penso que me têm escapado informações sobre o efectivo acompanhamento e preparação para esta evolução do problema por parte das autoridades competentes, como me escaparam, ainda, as explicações que as mesmas autoridades estarão a dar aos portugueses.
Já se sabia que este governo nos pede que acreditemos em milagres, mas começa-se a perceber até onde vai a exigência de que os portugueses sejam gentes de robusta fé!

Regresso ao local do crime

Daniel Oliveira num Arrastão a solo. E arranca a caracterizar, assim, o drama deste país que nos esmigalha: «É pequeno. É minúsculo. É um penico. Toda a gente se conhece. E os debates acabam sempre em conversas de comadres.» Mesmo os que não vêem O Eixo do Mal já tinham percebido.
No 4R - Quarta República, uma magnífica passagem «Por Terras do Congresso do PSD», da autoria de Pinho Cardão. Já vai no 4º capítulo, promete continuar e é absolutamente imperdível. Deveria ser de leitura obrigatória para todos os militantes, notáveis, ou nem por isso.

Wednesday, May 24, 2006

Luandino Vieira recusou o Prémio Camões

«A vida é um rio de complexas águas»

Suprema hipocrisia!

Leio isto, e pasmo, com a desfaçatez das propostas do PSD para a educação.
Só por malícia e calculismo político pode o PSD vir agora advogar aquilo que sempre soube não poder, nem querer, implementar na gestão das escolas. Não que a decisão de escolher os gestores escolares por mérito individual, independentemente de serem, ou não, professores, seja, enquanto medida de gestão eficaz do sistema, uma má medida. Há muito que a chamada gestão democrática tem os dias contados, morta por esgotamento do modelo. Mas os custos políticos de tal medida foram sempre poderosos dissuasores de avançar para tais extremos, nos governos do PSD. Se estes não foram capazes de profissionalizar a gestão escolar, e muito menos criar a carreira de gestores escolares, como quer agora o PSD ser levado a sério?
Por outro lado, propostas como a contratação dos professores pelos estabelecimentos de ensino, ou a liberdade dos pais poderem escolher as escolas dos filhos são, por enquanto, utopias, que esbarram na inexistência de condições estruturais de suporte a tais procedimentos, na assimetria do parque escolar e na permissividade com que a administração educativa tem gerido a rede de escolas sob a sua tutela.
Ao fundo do túnel de enganos e de hipocrisia que envolve esta armadilhada proposta do principal partido da oposição, apenas se vislumbra uma luzinha - os interesses dos barões dos colégios brilham ao longe. Não tenhamos dúvida, são eles que "iluminam" este caminho.
Por mau caminho vai o PSD, com este tipo de discurso. Mal servida continua a educação. Entretanto, o PS agradece o disparate.

Antologia

Jake Baddeley



Lo queramos o no
sólo tenemos tres alternativas:
el ayer, el presente y el mañana.
Y ni siquiera tres
porque como dice el filósofo
el ayer es ayer
nos pertenece sólo en el recuerdo:
a la rosa que ya se deshojó
no se le puede sacar otro pétalo.
Las cartas por jugar
son solamente dos:
el presente y el día de mañana.
Y ni siquiera dos
porque es un hecho bien establecido
que el presente no existe
sino en la medida en que se hace pasado
y ya pasó...
como la juventud.
En resumidas cuentas
sólo nos va quedando el mañana:
yo levanto mi copa
por ese día que no llega nunca
pero que es lo único
de lo que realmente disponemos.

Nicanor Parra

Friday, May 12, 2006

Thursday, May 11, 2006

Para ler, meditar, e retirar as devidas consequências

Tretas, um post imperdível, num blogue todo ele imperdível, o «...bl-g--x-st--...».
Talvez não fosse a sua intenção, mas João Pinto e Castro explica, assim, como cresce, e floresce, uma parte da blogosfera:
«A crescente complexidade dos equipamentos com que interagimos no dia a dia associada à mania da especialização transformou-nos numa sociedade de incompetentes. O mesmo se passa em tudo o resto, e designadamente no mundo das ideias, onde a complexidade dos conceitos também foi acompanhada de um ensino cada vez mais focalizado em áreas cada vez mais exíguas. Vai daí, como ninguém sabe verdadeiramente do que fala, qualquer pessoa pode dizer o que lhe vier à cabeça sobre qualquer assunto sem correr grande risco de ser apanhado em falso.»
Não deixa, também, de explicar por que alguns de nós se deverão dedicar a outras actividades:
«Como combatê-la (a conversa da treta)? Primeiro, esforçando-nos por não falarmos daquilo que ignoramos ou em que não meditámos, o que nem sempre é fácil, porque a pressão para asnear é muito forte. Segundo, treinando o nosso sentido crítico e aprendendo a questionar as afirmações alheias, particularmente aquelas que assumem um tom mais peremptório.»
Depois disto, retiro-me para reflexão.

Tuesday, May 09, 2006

Se Teixeira dos Santos fosse rei...

... passaria à história com o cognome de O Desvalorizador.

«uma lady na mesa, uma louca na cama»

A expressão é utilizada por Pacheco Pereira na sua curta nota no blogue ABRUPTO, a propósito do Congresso do CDS/PP. Nota bastante infeliz e pouco ao nível deste comentador, acrescente-se, quer pela rebuscada forma utilizada para dizer o óbvio - que este partido se encontra dividido ao meio - quer pela manifesta falta de gosto na utilização da expressão referida. Convém não esquecer que a Presidente da Mesa é Maria José Nogueira Pinto, reconhecidamente uma lady. Não duvidando que não houve, por parte de JPP , a tentativa de insinuar o que quer que seja, a verdade é que existiu uma abrupta falta de elegância da sua parte. Da qual, como o cavalheiro que é, se deveria retratar.

Escola tonta e insensata

Na sua crónica de hoje, no Público, Eduardo Prado Coelho é demolidor relativamente à acção do Ministério da Educação e à aparente eficácia deste na gestão da educação em Portugal. Escreve ele:
«Pelo caminho que as coisas estão a tomar, assistiremos a uma barbarização dos professores cada vez mais desmotivados, cuja única obsessão passa a ser defenderem-se dos insultos e dos inqualificáveis palavrões que ouvem à sua volta. A escola transforma-se num espaço de batalha campal, com o apoio da demagogia dos paizinhos, que acham sempre que os seus filhos são angelicais cabeças louras. E com a cumplicidade de pedagogos do ministério. Quando precisaríamos como de pão para a boca de um ensino sólido, estamos a criar uma escola tonta e insensata
Não poderia EPC definir melhor aquilo em que a obsessão punitiva contra a classe docente, que tem esta equipa da 5 de Outubro, está a transformar as escolas. Mesmo para aqueles que queiram ler no que ele escreve sobre o secretário de estado Valter Lemos um antagonismo anterior e exterior à acção deste à frente dos recentes desmandos na educação, uma coisa é certa: o governante em causa tem demonstrado um completo desconhecimento das reais necessidades do nosso debilitado sistema educativo, servindo-se de uma despudorada inconsistência formal, sempre que são questionadas as incompreensíveis razões da sua acção.
Também por aqui se vem dizendo, há muito, que as medidas introduzidas à força por esta ministra da educação não conduziram, e nem conduzirão, a uma escola de qualidade, como a propaganda do governo nos quer fazer crer, mas Prado Coelho deixa-nos a imagem perfeita daquilo em que se transformou a escola do governo Sócrates:
«O problema reside em considerar os professores como meros funcionários públicos e colocá-los na escola em sumária situação de bombeiros prontos a ocorrer à sineta de alarme
Esquece o governo que o alarme é outro, e que, por isso mesmo, não se resolverá desta forma.

you are welcome to elsinore*

Na aventura do viver, a partilha é sempre um gesto inacabado.

Ao longo da muralha que habitamos
há palavras de vida há palavras de morte
há palavras imensas, que esperam por nós
e outras, frágeis, que deixaram de esperar
...

* Mário Cesariny

Saturday, May 06, 2006

Amanhã...



Não? Pois, devia...

Hoje...


Freitas (Des)cansado

Ontem...



Freitas Cansado

A pujança dos partidos da oposição (II)

Na Batalha (tão a propósito!), e naquilo que o próprio considerou «uma reunião de família», Ribeiro e Castro, « fresquíssimo e determinado», prepara-se para a segunda entronização como presidente do partido, concorrendo contra o fantasma do antagonismo militante. Tão determinadamente quer acabar com este, que não demorará muito que o antigo partido do táxi passe a partido asa delta (Lisboa/Bruxelas/Lisboa).
Se Sócrates ainda se desse ao incómodo de pensar no CDS, poderia, descansadamente, deixar de o fazer.

A pujança dos partidos da oposição (I)

Foram apenas 36% dos militantes do PSD que se deram ao incómodo de votar nas primeiras directas da história do partido, tendo Marques Mendes sido eleito com 91% dos votos entrados em urna.
Estranhamente, o eleito canta vitória e interpreta os 36% de votantes como um «um sinal de força e de vitalidade do partido que os militantes deram».
Sócrates pode continuar descansado!

Friday, May 05, 2006

Thursday, May 04, 2006

La donna e mobile qual piuma al vento...

A semana vai fértil, em notícias da educação. Entendeu a central de propaganda do governo ser este o momento de entreter o país com uma tômbola de novidades, para "almofadar" algumas peripécias menos simpáticas com a publicação da lista de colocação de professores e com o despacho dos destacamentos de professores doentes (que Valter Lemos dizia não ter feito e que, afinal, parece que sempre tinha produzido, provavelmente em plena crise de sonambulismo, já que não se admite que possa ser um mentiroso compulsivo - apesar dos antecedentes de autarca, nos tempos do Politécnico, cala-te boca) e ainda para absorver as esperadas ondas de choque que o final do ano lectivo e os resultados dos exames sempre provocam.
Numa exímia demonstração do domínio das técnicas de propaganda, a catadupa de notícias divide-se em muito boas, assim-assim e até uma dramática, mas o efeito desta não será grave, pois a catalogação do "desastre" vem da própria ministra, e logo devidamente acompanhada das miraculosas soluções-maravilha, que transformarão o drama em commedia dell 'arte!
O muito bom, para o governo, não deixa de ser uma janela de oportunidade para as escolas e para os profissionais da educação, que a quiserem agarrar bem - a criação do conselho coordenador das escolas públicas. Sem uma real autonomia das escolas e sem a profissionalização da gestão escolar, este conselho nasce prematuramente, mas ponha-se a criatura na incubadora das boas-vontades, e pode ser que seja algo mais do que um nado-morto.
O dramático, no dizer da ministra, é o estado do ensino secundário, com taxas de abandono e reprovação que nos deixam de rastos nas estatísticas e estragam a imagem deste governo feliz, sem lágrimas. O desastre é, efectivamente, muito grande, mas as soluções encontradas não passam da panaceia do costume, se bem que repetidas com entusismo e convicção, tanta que quase acreditamos na ingenuidade das intenções. Os resultados, decerto, não passarão do que tem sido habitual, e dentro de uns anos andaremos, ainda, às voltas com estatísticas aterradoras. É a vida, dirá Guterres, bem colocado para apoiar os portugueses que acordem e decidam fugir deste colapso permanente, em que transformaram Portugal.
No assim-assim, passamos pelas novas orientações que são dadas às cantinas escolares, para o fornecimento de refeições mais saudáveis (sai barato e entusiasma os potenciais candidatos a modelos); pelo investimento de dois milhões e meio de euros a "lavar a cara" às escolas que vão receber os alunos cujas escolas encerraram (os alunos levantam-se ao cantar do galo, deitam-se com as galinhas, mas ganham o direito a vivenciar a experiência de terem que batalhar pela sobrevivência em bandos de colegas hostis); e pelos incentivos a um 1º ciclo de mais qualidade (de onde sairão sem saberem escrever e contar, mas a dançarem em inglês e a representarem ao melhor estilo morangos com açúcar).
Não querendo ser pessimista, que a situação é desesperada, e grave, antecipo mais um ano lectivo sem as necessárias, e profundas, mexidas de que o sistema educativo precisa, e merece.
O futuro, entretanto, qual erva daninha, vai abrindo caminho a custo, mas em passos irreversíveis, apesar do governo, da ministra e de tutti quanti. O Projecto Escola Interactiva é um dos seus intrumentos e está no terreno, com propostas suficientemente apelativas para nos fazerem acreditar que uma escola nova é uma inevitabilidade. Será a reboque, mas lá chegaremos.

Wednesday, May 03, 2006

Em média, ocorre uma morte por hora

O surto de cólera em Angola, que ainda não atingiu o seu ponto máximo e já fez, em poucas semanas, mais de mil mortos, agrava-se, tanto por via do subdesenvolvimento (excesso de população, deficiência nas estruturas de saneamento básico e precaridade dos cuidados básicos de higiene e saúde pública), como do desenvolvimento (melhores acessibilidades, maior mobilidade das populações, expansão territorial da doença). Entretanto, o governo angolano tem mantido uma teimosa atitude de rejeição face ao crescente agravamento do problema e na recusa à ajuda internacional.

Erro no multibanco impede pagamento de dívidas fiscais

Aos contribuintes resta-lhes dirigirem-se às repartições de Finanças.
Simplex!

Antologia

Como é possível perder-te
sem nunca te ter achado
nem na polpa dos meus dedos
se ter formado o afago
sem termos sido a cidade
nem termos rasgado pedras
sem descobrirmos a cor
nem o interior da erva.

Como é possível perder-te
sem nunca te ter achado
minha raiva de ternura
meu ódio de conhecer-te
minha alegria profunda.

Maria Teresa Horta

Tuesday, May 02, 2006

As nossas sociedades modernas não podem aceitar o fatalismo das misérias humanas (II) *

Menosprezar o discurso do Presidente Cavaco Silva, remetendo-o para o saco de caridosas palavras de conforto e simpatia, mais ou menos inconsequentes, e atribuir-lhe como intenção primordial esquivar-se a uma contenda com um parlamento apanhado em falta, ou a entalar o governo pela má performance na gestão político-económica deste país, que três relatórios fizeram questão em evidenciar, é continuar a ver a árvore e não ver a floresta, pior ainda, é um exercício de estultícia, que só desqualifica quem se dá ao trabalho de exercitar tal raciocínio. Mesmo quanto àqueles que, não se atrevendo à crítica feroz, relegaram o discurso para a categoria de uma peça elaborada com o pouco nobre objectivo de agradar a todos, pretensão que, segundo tão caridosas almas, o Presidente teria tido relativamente a esta sua primeira intervenção de fundo após a posse, só posso dizer que acho que estão a imitar, magnificamente, a avestruz.
Dos centos de metros de comentários que sobre o assunto se têm produzido, não foi por acaso que me socorri da frase mais reveladora do que escreve Medeiros Ferreira hoje no DN, para titular estas notas. Fi-lo porque, num texto que me pareceu um mortal à rectaguarda, empranchado, em que Medeiros Ferreira parece querer vir salvar a honra de uma esquerda estupefacta pelo terreno pelo qual o Presidente se aventurou, logo aquela esquerda para quem as questões da pobreza dos verdadeiramente pobres e da exclusão dos verdadeiramente excluídos são pedras de toque esquecidas na trituradora da propaganda e do interesse político menos transparente dos actuais gestores da coisa pública, é essa frase que sintetiza, de forma lapidar, quer as razões que levaram o Presidente a dizer o que disse, quer o desafio que lançou à sociedade portuguesa, toda ela, para resolver esta questão essencial para a nossa democracia. Essencial, sim, porque, «o sonho de um País livre e democrático é indissociável da ambição de uma sociedade mais desenvolvida e com mais justiça social» e, se «muito progredimos na modernização da economia e na afirmação de novos estilos de vida, ficámos muito aquém na concretização dessa ambição de uma sociedade com maior justiça social», não sendo « moralmente legítimo pedir mais sacrifícios a quem viveu uma vida inteira de privação». As palavras são do Presidente no seu discurso, mas a esses comentadores com pendor suicida para a irrelevância, eu pergunto: quantos dos homens de Abril as renegariam, então, como o móbil da sua acção? Quantos deles as enjeitariam, hoje, como despiciendas, face a um adquirido de bem-estar e desenvolvimento, que a liberdade de Abril trouxe? Quantos desses fazedores da revolução sem sangue podem não subscrever as preocupações deste Presidente que, em tão sinalado dia, foi ao cerne do que não fomos, ainda, capazes de fazer com a liberdade que conquistámos, ou recebemos?
Reli o discurso do PR e, quanto mais o releio, mais simples e clara lhe encontro a mensagem, mas também mais dura e acusatória a interpreto. Porque ela é, em simultâneo, um forte abanão às consciências de todos nós, e ele não se exclui, pelas oportunidades que desperdiçámos, e um lancinante apelo, para que este desperdício não volte a repetir-se.
«É, seguramente, aos gestores do momento que cabe decidir os caminhos, mas é onde esses caminhos nos levam que lhes hão-de dar, ou não, o reconhecimento das novas gerações. Fomos capazes de concretizar o sonho de um Portugal livre e mais próspero, mas estamos longe de podermos realizar a aspiração de maior justiça social. Os Portugueses esperam dos políticos, que livre e democraticamente elegeram, que estejam à altura dessa exigência, que se empenhem em dar uma nova esperança aos mais desfavorecidos da nossa sociedade, que cooperem no sentido de mais facilmente poderem superar as dificuldades e naturais divergências ideológicas
Se nestas palavras do Presidente não formos capazes de ver autocrítica, nem crítica, nem avisos, não admira que não sejamos capazes de ver no discurso mais do que irrelevantes considerações e um desafio para um compromisso cívico para a inclusão social destinado ao fracasso. Se assim for, simplesmente não estamos à altura do Presidente que temos. Se assim for, eu sou dos que acredita que só nos resta um caminho: crescermos como povo, para nos pormos ao seu nível. E para não sucumbirmos, uma vez mais, à espuma dos dias.
* passagem retirada do artigo de opinião de Medeiros Ferreira, no DN.

As nossas sociedades modernas não podem aceitar o fatalismo das misérias humanas (I)*


Na sonolenta lazeira do feriado dedicado ao trabalhador, com uma calorosa brisa de um começo de manhã fortemente ensolarada a obrigar-me a rever o programa «turístico» do último dia das miniférias, não pude deixar de ir ouvindo o som da televisão que chegava dos fundos da casa e me alertava para que o remanso daquela varanda preguiçosa sobre o rio, mais não era do que uma curta e frágil trégua na espuma revoltosa dos nossos cinzentos dias. A SIC notícias repetia O Eixo do Mal, e os residentes do programa afadigavam-se em convencer-nos, em tom gritado cada vez mais alto, que a nossa crise só eles, iluminados, a percebem em toda a sua extensão, e que se não têm o remédio para a mesma, andam por lá muito perto, tanto que quase acreditamos que se deveria «dispensar» o governo e governar o país a partir dos bitaites que proliferam pelos comentários com que a verborreia televisiva nos matraca. Um parêntesis, só para constatar como é muito divertido ouvir um programa televisivo, sem o ver, porque o ridículo de algumas afirmações, de que a imagem nos distrai, se torna tão evidente, que merecerem-nos um sorriso constitui uma enorme generosidade da nossa parte. Mas adiante.
Um dos comentadores, que, pela voz, não reconheci, falava ainda do discurso de Cavaco Silva na AR e (pelo menos o tom era de seriedade, garanto), com indignada e superior convicção, afadigava-se em demonstrar que a peça mais não é do que um estafado conjunto de banalidades alinhavadas para fugir à agenda dos reais problemas do país, que um PR não poderia ter iludido, em ocasião de tal solenidade e relevância histórica. Admito que tenho a tendência, ao ouvir isto, para desligar e encolher os ombros, pensar que opiniões com esta inconsistência há muitas, que as palavras leva-as o vento, que o tempo se encarregará de demonstrar que…, enfim, as muletas do costume, quando nos confrontamos com o que consideramos banalidades daquele teor. Mas será que é esta a atitude a tomar - continuarmos a ser dóceis consumidores destes comentários que consideramos da treta – o que, no limite, constitui uma extrema arrogância das nossas convicções, face àquilo com que não concordamos? Será que, se fosse esta uma opinião coincidente com a minha, tão rápida e facilmente lhe encontraria a mesma fragilidade argumentativa, a condenaria pela cegueira ao essencial, a remeteria para o baú da reciclagem intelectual? Concluindo que a minha resposta poderia (pelo menos deveria) ser não, dediquei ao assunto algum do meu tempo, e paciência, para no final, confesso desde já, ter ficado «na minha», isto é, pensando o que já pensava (e escrevi aqui) sobre o discurso do Presidente Cavaco Silva. O exercício não foi, contudo, inteiramente estéril.
* passagem retirada do artigo de opinião de Medeiros Ferreira, no DN.

Monday, May 01, 2006

Dia do Trabalhador

Para quantos, já não é? Para quantos, nunca foi? Para quantos, deixará de ser?


Até reparo que tenho só esperança
nada mais do que esperança
pura esperança
esperança verdadeira
que engana
e promete
e só promete.

Almada Negreiros