A educação continua a preocupar o meu amigo Anthrax, que, naquele seu estilo inimitável, faz três perguntinhas, muito a propósito. Respondendo, direi que claro que será «interessante» (ai essa maldadezinha!) chamar à razão as famílias (e que falta lhes faz, a razão), responsabilizar os professores (para muitos deles, ainda mais?), envolver todos os agentes educativos (essa hidra, que não sabemos quantas cabeças tem, mas que desconfio que não tem nenhuma!). Temos anos de tudo isso, quilómetros de teses sobre boas práticas, quilos de estudos, milhares de experiências (ministeriais, regionais, locais, de escola, de turma, de professores, etc, etc, etc...), «pipas de massa» gastas e o resultado são umas quantas gerações de cobaias analfabetas, ou quase.
Então, o que falhou, o que tem falhado sempre?
Para começar, algo difícil de mudar:este nosso ser português, desenrascado e fanfarrão, pouco consistente em estudo que dê trabalho, amigo da conversa de café e de salão, desenvolto no linguajar, mas avesso ao aprofundamento de ideias, deslumbrado com o emprego por cunha e doutorado nas manhas da sobrevivência profissional amarrada a políticas sociais e laborais securizantes.
Mas o pior, foi que não conseguimos reaver o valor social e o valor cultural da educação, muito debilmente mantidos na nossa caminhada republicana e irremediavelmente perdidos depois de Abril. Sem que esses valores sejam recuperados, poderão suceder-se os ministros, gastar-se dinheiro, legislar-se para uma nova escola, mais autónoma e mais responsável, formarem-se melhor os professores, resolverem-se, pontualmente, assimetrias, que tudo permanecerá na mesma, ou mudará muito pouco, ficando o «sucesso» sempre ao sabor da vontade dos governos, da experiência dos titulares da pasta e da liderança milagreira em algumas escolas.
Portugal tem que ser capaz de eleger a educação como um valor essencial para o seu futuro colectivo, e ter a coragem de agir em conformidade. Nós, que tanto gostamos de referir modelos de sucesso, aprendamos a copiá-los, bem. Estudem-se o caso irlandês, o finlandês, mesmo outros nórdicos, definam-se metas e estratégias, e que cada governo, cada ministro da educação, cada director-geral, mas, acima de tudo, cada português, tenha por missão contribuir, à sua medida, para nos tornarmos um povo mais instruído, mais formado, mais culto. A missão do novo governo do PS, neste domínio, só pode ser a de conseguir que este desígnio se cumpra, mobilizando todos, independentemente da sua cor partidária. Rapidamente veremos se é por aqui que vamos, ou se iremos ter, apenas, mais do mesmo - medidas avulsas e de prazo fixo, o da duração da legislatura, ou, pior, do ministro.
1 comment:
"Temos anos de tudo isso, quilómetros de teses sobre boas práticas, quilos de estudos, milhares de experiências (...)"
É um facto. Temos mesmo. Mas pelos vistos ainda não conseguimos aprender nada.
Criámos verdadeiros monstros após o 25 do A. (ou então, para aqueles que acham que, a esta ideia está subjacente um certo ideal fascista do género repressivo-opressivo, libertámos os camaradas monstros com a revolução dos cravos).
O "ser português, desenrascado e fanfarrão, pouco consistente em estudo que dê trabalho, amigo da conversa de café e de salão, desenvolto no linguajar, mas avesso ao aprofundamento de ideias, deslumbrado com o emprego por cunha e doutorado nas manhas da sobrevivência profissional amarrada a políticas sociais e laborais securizantes.", é um ser que existe desde que o D. Afonso Henriques resolveu bater na Dona Teresa (que por acaso até era sua mãe, mas naquela altura ninguém ligava muito à questão da violência doméstica). Para além disso, o estilo está também retratado num documento do século XVII, escrito por um sociólogo francês no âmbito das Campanhas Napoleónicas e se querem informações adicionais leiam os livros do "Sharpe" do escritor Bernard Cornwell - os títulos que dizem respeito às Guerras Peninsulares - que também lá tem a descrição dos Portugueses.
Ser português é histórico (alguns - os mais extremistas - dirão mesmo que é Pré-histórico), é uma tradição, é como estacionar o carro em segunda fila empatando o trânsito todo e ainda reclamar quando lhe businam. É a falta da consciência cívica. É a falta do grilo falante do pinóquio (esse ao menos era de madeira, mas ainda tinha um grilo. Nós não temos nada.). É a falta da responsabilização individual, é o sacudir da água do capote, é o quem vem atrás que feche a porta «mas se me entalares, levas um borracho no meio da fronha que é para não achares que és mais esperto do que os outros».
É o caos. Se não for a Educação a resolver isto, não sei quem mais poderá resolver.
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