Ingmar Bergman era mentalmente doente, por uma debilidade da sua natureza, ou, segundo alguns, por força da educação fortemente repressiva que recebeu. O seu contributo para o cinema emana, em grande parte, desse caótico e deprimente universo pessoal, que alguma crítica ajudou a guindar a génio, classificando o seu caos interior, que ele estilhaçava em imagens, como expoente de intelectualidade. Enquanto que uma crítica snob e comprometida procurava, no desamparo cinematográfico da sua obra, o contraponto qualitativo, com marca de autor, à cinematografia clássica saída do star system, Bergman reconhecia que não conseguia ver nenhum dos seus filmes, sem ficar num estado de profundo desespero e depressão. É essa lúcida e cerebral abordagem à sua filmografia, que lamento ver perder-se com a sua morte. Com esta, voltarão as análises da intelectualidade reinante, as teses dos cinéfilos que não amam o cinema, e os aprofundamentos psicanalíticos da indústria, para quem a cinematografia bergmaniana apenas representa uma fatia de mercado, que convém alimentar na sua singularidade. Cinematografia bergmaniana que o próprio não identificava, sequer, e que para ele não passava de um espaço em que libertava os gritos de uma mente torturada e doente, que, expondo-se assim, buscava, obsessivamente, a autoregeneração. Que nunca encontrou no cinema, mas apenas no teatro. Bergman morreu, tão doentiamente demente como sempre foi, enfrentando, finalmente, o cavaleiro da morte, que tanto o obsessionou.
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