Com esta intervenção junto do ME, logo haverá quem pense que o CDS quererá cavalgar a onda da indignação generalizada com a morte dos professores doentes terminais, obrigados a regressar ao serviço. De facto, quando lemos isto e, constrangidos que nos sentimos a uma objectividade militante, a que inevitavelmente nos conduz a permanente desresponsabilização do governo, com facilidade acusamos o partido de Portas, quando não o próprio Portas, de estar a fazer aproveitamento político de uma situação que puxa à lágrima fácil e à indignação popular. Admito que o CDS de Portas possa justificar ceder à tentação de lhe atribuir tais intenções, e também eu não deixo de ler esta notícia com uma certa reserva. Pode ser que Portas esteja apenas a encontrar a sua janela de oportunidade para aparecer, mostrando serviço, que lhe renderá uns votos, no momento oportuno. Não sei se é o caso, nem me interessa, mas a morte dos dois docentes, que, em tão pouco tempo, saltou para a comunicação social, deve levar-nos a pensar no que, efectivamente, e em nome de um défice de humanidade, levou o CDS a pedir explicações ao ME.
Primeira questão: Porquê ao ME, e não ao MF, de quem dependem as juntas médicas da CGA? Até parece que o CDS estará a assestar baterias para o alvo errado, quando nos limitamos ao desprezo com que a ministra descartou responsabilidades no primeiro dos casos, ou a soberana displicência com que o seu assessor de imprensa remete qualquer explicação, sobre o segundo, para outras entidades, que não o ME. Acontece que, mesmo que formalmente, a responsabilidade caiba a outra entidade, impõe-se que o ME informe o que sabe sobre estas e outras situações (que as há, infelizmente, aguardando desfecho trágico), se as tem identificadas, e qual a política que segue para a sua resolução e enquadramento. Porque ao ME compete ter essa política e aplicá-la, com transparência e isenção. Por outras palavras, deve o ME aos profissionais que tutela, e à opinião pública, uma explicação quanto à política que segue para casos como estes, quais as ordens que transmite às escolas para lidar com eles, que posição tomou junto do MF e do Primeiro-ministro, relativamente aos dois casos já conhecidos, e se o desenlace brutal de ambos teve como consequência o realinhamento de políticas seguidas nesta matéria. É, portanto, contra o silêncio e o desprezo do ME, que entendo dever ser compreendido o pedido de explicações que, só aparentemente por “erro”, o CDS lhe dirige.
Segunda questão: A desumanidade contra professores, invocada pelo CDS, não estará a ser ridiculamente empolada, uma vez que mais não estamos do que perante a aplicação, pura e simples, dos mecanismos legais e dos procedimentos médicos usuais para situações semelhantes, independentemente da carreira profissional do trabalhador em causa? Numa primeira abordagem, até parecerá que sim, que o empolamento existe, uma vez mais se apenas nos cingirmos à frieza com que o ME ignorou estes dois casos, ambos atingindo profissionais que tutela, que pertencem a uma carreira com características específicas, características essas que o empregador definiu, e que tem o dever de conhecer muito bem. E é também à luz das características da carreira docente, que podemos encontrar o fundamento da desumanidade que o CDS invoca, e que os dois casos até agora conhecidos representam. Perguntam os bonzos do regime, do alto da sua “razão”: se em vez de professores se tratasse de profissionais de qualquer organismo da AP, a questão da desumanidade não se colocaria? Parece-me que é a estas “tábuas” que o ME, e o governo, querem encostar todos aqueles que vêem nestes dois casos uma enorme falta de humanidade. A resposta, para mim, é simples: obrigar um doente terminal, de qualquer carreira, a morrer a trabalhar, é uma violência, e uma desumanidade. Mas, se às circunstâncias quisermos abrir espaço, não para “medir” a desumanidade, mas para a analisar nos níveis de requinte a que pode chegar, não terei dúvidas em dizer que compreendo melhor que uma junta médica veja como possível a continuidade da prestação profissional de um funcionário com cancro na laringe, sem voz, num gabinete de um qualquer organismo, do que remeter um doente destes para uma escola, onde a sua função é ensinar alunos, e o seu primordial instrumento de trabalho é a voz. Ao fazê-lo, a junta médica tem que saber que a decisão sobre o funcionário tem implicações directas sobre os alunos e sobre a escola, tornando nulos os “ganhos” que poderiam advir desta violência praticada sobre um ser humano, na situação extrema de estar a viver o seu próprio fim. Ora, a que outra entidade, que não ao ME, se deve exigir que informe, com rigor, as juntas médicas da CGA, sobre as especificidades da carreira docente? É, portanto, também contra esta falha de actuação do ME , no âmbito da sua responsabilidade no que diz respeito às especificidades da carreira dos profissionais que tutela, que deve ser entendido este pedido de explicações do CDS ao ministério de Maria de Lurdes Rodrigues.
Terceira questão: pretende o CDS, com o pedido de esclarecimentos que apresentou ao ME, que passe para a opinião pública a ideia de que o ministério terá outras “culpas no cartório”, quanto à resolução dada a estes dois casos? Se pretende, ou não, só o CDS poderá responder, mas a forma como resolveu lidar com o assunto leva-nos a, quiçá abusivamente, concluir que sim. E se o faz com essa intenção tem, quanto a mim, toda a legitimidade para isso. Recordemos: a ministra da educação iniciou o seu mandato produzindo as afirmações mais lesivas da imagem dos professores, que alguma vez se tinham ouvido a um governante, contra a classe profissional que tutela. Com essas afirmações, e com as acções que tem vindo a tomar contra os professores, a ministra da educação deixou, junto da população, a imagem dos professores como profissionais irresponsáveis, desmotivados, faltosos, incompetentes, carregados de privilégios, e regiamente pagos, a quem havia que, em nome da qualidade do sistema educativo, meter na ordem. Consequências? Várias, nenhuma delas proveitosa para a qualidade do “sistema”, todas elas prejudicando as escolas, os alunos, os professores, em suma, a educação portuguesa. Uma das consequências poderá ter sido esta, de que vemos agora os resultados – perante professores doentes, as juntas médicas sentem-se perfeitamente caucionadas para fazerem um agrado ao governo, acabando com a “bandalheira”, que a ministra afirma estar profundamente enraizada na classe docente. Vai daí, acham-se no direito de agir com base no pressuposto que o governo lhes deu, de bandeja: ora então, mais um professor a querer ficar em casa? Só porque tem um cancro? Nem pensar, malandro, vai mas é trabalhar!
É, portanto, contra esta caixa de Pandora que a ministra abriu, que tem razão o CDS em vir pedir justificações ao ME, falando de desumanidade sobre docentes forçados a morrer a trabalhar.
Se Portas e o seu partido não pensaram em nenhuma destas razões, mas apenas no que podem lucrar com esta causa, lamento-o, por eles e pelos seus apoiantes. Mas que a causa é uma causa justa, e há mais do que fundamento para a abraçarem, isso há. Aguardemos, para ver o que vai responder a titular da pasta, e o governo, e o que fará o CDS a seguir.
Primeira questão: Porquê ao ME, e não ao MF, de quem dependem as juntas médicas da CGA? Até parece que o CDS estará a assestar baterias para o alvo errado, quando nos limitamos ao desprezo com que a ministra descartou responsabilidades no primeiro dos casos, ou a soberana displicência com que o seu assessor de imprensa remete qualquer explicação, sobre o segundo, para outras entidades, que não o ME. Acontece que, mesmo que formalmente, a responsabilidade caiba a outra entidade, impõe-se que o ME informe o que sabe sobre estas e outras situações (que as há, infelizmente, aguardando desfecho trágico), se as tem identificadas, e qual a política que segue para a sua resolução e enquadramento. Porque ao ME compete ter essa política e aplicá-la, com transparência e isenção. Por outras palavras, deve o ME aos profissionais que tutela, e à opinião pública, uma explicação quanto à política que segue para casos como estes, quais as ordens que transmite às escolas para lidar com eles, que posição tomou junto do MF e do Primeiro-ministro, relativamente aos dois casos já conhecidos, e se o desenlace brutal de ambos teve como consequência o realinhamento de políticas seguidas nesta matéria. É, portanto, contra o silêncio e o desprezo do ME, que entendo dever ser compreendido o pedido de explicações que, só aparentemente por “erro”, o CDS lhe dirige.
Segunda questão: A desumanidade contra professores, invocada pelo CDS, não estará a ser ridiculamente empolada, uma vez que mais não estamos do que perante a aplicação, pura e simples, dos mecanismos legais e dos procedimentos médicos usuais para situações semelhantes, independentemente da carreira profissional do trabalhador em causa? Numa primeira abordagem, até parecerá que sim, que o empolamento existe, uma vez mais se apenas nos cingirmos à frieza com que o ME ignorou estes dois casos, ambos atingindo profissionais que tutela, que pertencem a uma carreira com características específicas, características essas que o empregador definiu, e que tem o dever de conhecer muito bem. E é também à luz das características da carreira docente, que podemos encontrar o fundamento da desumanidade que o CDS invoca, e que os dois casos até agora conhecidos representam. Perguntam os bonzos do regime, do alto da sua “razão”: se em vez de professores se tratasse de profissionais de qualquer organismo da AP, a questão da desumanidade não se colocaria? Parece-me que é a estas “tábuas” que o ME, e o governo, querem encostar todos aqueles que vêem nestes dois casos uma enorme falta de humanidade. A resposta, para mim, é simples: obrigar um doente terminal, de qualquer carreira, a morrer a trabalhar, é uma violência, e uma desumanidade. Mas, se às circunstâncias quisermos abrir espaço, não para “medir” a desumanidade, mas para a analisar nos níveis de requinte a que pode chegar, não terei dúvidas em dizer que compreendo melhor que uma junta médica veja como possível a continuidade da prestação profissional de um funcionário com cancro na laringe, sem voz, num gabinete de um qualquer organismo, do que remeter um doente destes para uma escola, onde a sua função é ensinar alunos, e o seu primordial instrumento de trabalho é a voz. Ao fazê-lo, a junta médica tem que saber que a decisão sobre o funcionário tem implicações directas sobre os alunos e sobre a escola, tornando nulos os “ganhos” que poderiam advir desta violência praticada sobre um ser humano, na situação extrema de estar a viver o seu próprio fim. Ora, a que outra entidade, que não ao ME, se deve exigir que informe, com rigor, as juntas médicas da CGA, sobre as especificidades da carreira docente? É, portanto, também contra esta falha de actuação do ME , no âmbito da sua responsabilidade no que diz respeito às especificidades da carreira dos profissionais que tutela, que deve ser entendido este pedido de explicações do CDS ao ministério de Maria de Lurdes Rodrigues.
Terceira questão: pretende o CDS, com o pedido de esclarecimentos que apresentou ao ME, que passe para a opinião pública a ideia de que o ministério terá outras “culpas no cartório”, quanto à resolução dada a estes dois casos? Se pretende, ou não, só o CDS poderá responder, mas a forma como resolveu lidar com o assunto leva-nos a, quiçá abusivamente, concluir que sim. E se o faz com essa intenção tem, quanto a mim, toda a legitimidade para isso. Recordemos: a ministra da educação iniciou o seu mandato produzindo as afirmações mais lesivas da imagem dos professores, que alguma vez se tinham ouvido a um governante, contra a classe profissional que tutela. Com essas afirmações, e com as acções que tem vindo a tomar contra os professores, a ministra da educação deixou, junto da população, a imagem dos professores como profissionais irresponsáveis, desmotivados, faltosos, incompetentes, carregados de privilégios, e regiamente pagos, a quem havia que, em nome da qualidade do sistema educativo, meter na ordem. Consequências? Várias, nenhuma delas proveitosa para a qualidade do “sistema”, todas elas prejudicando as escolas, os alunos, os professores, em suma, a educação portuguesa. Uma das consequências poderá ter sido esta, de que vemos agora os resultados – perante professores doentes, as juntas médicas sentem-se perfeitamente caucionadas para fazerem um agrado ao governo, acabando com a “bandalheira”, que a ministra afirma estar profundamente enraizada na classe docente. Vai daí, acham-se no direito de agir com base no pressuposto que o governo lhes deu, de bandeja: ora então, mais um professor a querer ficar em casa? Só porque tem um cancro? Nem pensar, malandro, vai mas é trabalhar!
É, portanto, contra esta caixa de Pandora que a ministra abriu, que tem razão o CDS em vir pedir justificações ao ME, falando de desumanidade sobre docentes forçados a morrer a trabalhar.
Se Portas e o seu partido não pensaram em nenhuma destas razões, mas apenas no que podem lucrar com esta causa, lamento-o, por eles e pelos seus apoiantes. Mas que a causa é uma causa justa, e há mais do que fundamento para a abraçarem, isso há. Aguardemos, para ver o que vai responder a titular da pasta, e o governo, e o que fará o CDS a seguir.
1 comment:
Como sempre, é preciso acontecer a desgraça para se prometerem mudanças!!!
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