Wednesday, June 09, 2004

Esta morte brutal, por repentina, deixa-nos todos à procura do sentimento certo e da palavra correcta.
Dado o «tremendismo» do senhor, escudam-se as vozes no perfil académico, no percurso cívico do serviço à democracia e ao Estado, na competência técnica. É seguro e cai bem.
Esquecem-se as inconveniências de quem nunca cedeu ao politicamente correcto, deixam-se no esquecimento as deambulações partidárias (ou a independência ao serviço de?), ignoram-se a inflexibilidade, o mau feitio e o culto do rancor de que, tão frequentemente, o acusavam os «sobreviventes» habituais da nossa arena política, especialistas na pirueta do oportunismo militante. Percebe-se esta atitude, dada a santidade instantânea que a morte confere aqueles que, em vida, nunca abdicaram de si.
Morreu Sousa Franco, paz à sua alma, condolências à sua família e a este país, a quem Homens assim fazem falta, militem em que partido for, porque já não sobram muitos da mesma estirpe, e todos são poucos para nos tirar da mediocridade e do marasmo.
Esteve muito bem Durão Barroso, que evocou o valor da vida; e Deus Pinheiro, que chorou o homem e o amigo.
Partilhemos, com eles e com todos os outros, o choque e a fúria desta perda, mas não esqueçamos Sousa Franco, com o bom e o menos bom de si que teve a coragem de partilhar connosco.
Santificá-lo, adoçar-lhe os traços, será uma forma de lhe diminuir o valor; e ele não gostaria, por não lhe estar na natureza.

1 comment:

BSC said...

Excelente texto Crackdown.

Só a independência de espírito permite tão certeira análise sobre o homem e o político!

Mas compreendo o lado dos que se escudam atrás do perfil académico, mais consensual e politicamente correcto.